Embora a gente ainda viva em uma sociedade com influências do modelo padrão de casamento entre homens e mulheres, onde cada um deve agir segundo seu papel, as coisas estão mudando e estão surgindo novas formas de se relacionar que rompem esses elementos de formas distintas e muitas vezes simultâneas.

Essas novas formas de se relacionar já são bem conhecidas pela maioria das pessoas, ainda que de forma superficial. Em tempos de constantes revoluções tecnológicas em que vivemos, coisas que, até pouco tempo eram novidade, hoje é visto como “normal”. É o caso dos relacionamentos virtuais que, se antes eram esporádicos e restritos aos chats, hoje o “virtual” é, através dos celulares, algo presente em qualquer relacionamento.

Surgiram termos como ficar, uma espécie de namoro que se esgota em pouco tempo, mas o ficar se distingue do namoro não apenas pelo tempo de duração. Essa forma de relacionamento inclui um “desapego” maior, onde os envolvidos podem ficar com outras pessoas. Uma pessoa pode ficar com alguém apenas uma noite, como pode ficar várias vezes e se tornar um namoro. Porém, o ficar não exige fidelidade. Uma pessoa pode, inclusive, ficar com várias pessoas numa mesma noite.

O ficar se tornou uma prática comum aos jovens e uma espécie de fase anterior ao namoro. Por isso não podemos dizer que o ficar se trata de uma nova forma de relacionamento, mas, segundo Regina Navarro Lins, autora do livro Cama na Varanda, ele contribui com o fortalecimento e aceitação do poliamor.

As pessoas que ficam, querem manter sua individualidade e liberdade para ficarem quando quiserem, ou ainda, em alguns casos, escolher qual dos ficantes escolher para sair, cortejar e/ou fazer sexo. Além disso, o ficar contribui para a ressignificação dos sentimentos de posse e ciúmes, já que o ficar permite relações simultâneas. Os envolvidos sabem dessa condição, o que dá certa leveza e sensação de liberdade.

Com o passar do tempo, uma relação de ficar pode tornar-se cada vez mais frequente, podem surgir regras e, dependendo da situação, a relação pode acabar se tornando um namoro. O ficar também serve como experimentação mais ampla, antes de iniciar um relacionamento mais estável.

Outra forma de relacionamento bem distinta do tradicional e que vem conquistando cada vez mais adeptos e espaço na mídia é o poliamor. A filosofia do poliamor também confronta a ideia clássica de casamento e relacionamento. Independente da relação em que estão no momento, os adeptos do poliamor estão abertos a possibilidade de amar novas pessoas e construir novos relacionamentos.

Um relacionamento poliamoroso (ou poliafetivo) não tem estrutura fixa. Nele, ambos envolvidos estão abertos a novas possibilidades de amar. Um relacionamento que começa a dois pode, num determinado momento, incluir uma terceira pessoa, transformando-se numa relação a três (trisal). Um casal de homem e mulher pode, por exemplo, incluir uma mulher ou um homem, ou até mesmo mais pessoas. Esses trisais geralmente vivem no mesmo local, e pode haver interação sexual entre todos ou apenas entre dois dos envolvidos, podendo assim cada elemento da relação ter uma orientação heterossexual ou bissexual.

Essas relações poliamorosas se estabelecem a partir da vontade e do diálogo dos participantes de cada relacionamento, não havendo um modelo definido ou definitivo. Diferente do ficar, o poliamor pode incluir relações de maior duração. Inclusive, no Brasil em 1 de abril de 2016 foi reconhecida oficialmente a primeira união estável para um relacionamento estável poliafetivo. A oficialização traz todos os benefícios de uma união estável convencional, como direitos de herança, divisão de bens a todos os envolvidos, etc.

Em tempos de constantes revoluções tecnológicas em que vivemos, coisas que, até pouco tempo eram novidade, hoje é visto como “normal”. É o caso dos relacionamentos virtuais que, se antes eram esporádicos e restritos aos chats, hoje o “virtual” é, através dos celulares, algo presente em qualquer relacionamento.

O diretor do Sindicato dos Notários e Registradores do Estado (Sinoreg/ES), Rodrigo Reis, explica que o principal empecilho encontrado pelos cartórios é o fato de ainda ser uma questão vista como novidade no Brasil. “É um tema novo e que ainda está sendo debatido pela jurisprudência. A lei ainda não permite, mas também não proíbe. É um vácuo que gera essa dúvida”, disse. Reis ainda enfatiza que não é permitido que haja um casamento entre três ou mais pessoas, o que caracterizaria bigamia, ato considerado crime no Brasil.  “É realizado uma Escritura Pública de União Estável Poliafetiva que, após ser feita em um cartório, é encaminhada à Justiça para rever a validação do documento. O que asseguraria os direitos hereditários, como a pensão, por exemplo” (FOLHA DE VITÓRIA, 2017).

Nessas relações há ressignificação de elementos tradicionais como a fidelidade, e a própria estrutura nuclear de família (um homem, uma mulher e filhos). A questão do ciúme também é ressignificada, visto como um elemento repressor, que restringe a liberdade de amar outras pessoas.

Segundo o modelo tradicional, uma pessoa não pode amar várias pessoas ao mesmo tempo. Desejar o outro significa que o parceiro não é mais desejável ou não existe mais amor no relacionamento.

O poliamor rompe, assim, com três crenças básicas de nossa sociedade, conforme aponta Regina Navarro Lins:

  • Crença básica 1: se meu parceiro(a) me ama, não deve haver nenhum desejo de uma relação íntima com qualquer outra pessoa.
  • Crença básica 2: se eu for um bom parceiro/marido/esposa/amante, se meu parceiro(a) estará tão satisfeito(a) que não vai desejar se envolver com mais ninguém.
  • Crença básica 3: é simplesmente impossível amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo.

Ao mesmo tempo, essa ruptura propõe novas crenças básicas que sintetizam os princípios dos relacionamentos poliamoristas.

  • Nova crença básica 1: meu(minha) parceiro(a) me ama e confia tanto em mim que nós podemos permitir que nosso relacionamento se expanda e se enriqueça ao experimentar mais amor de outras pessoas. Há uma abundância de amor no mundo e há o suficiente para todos, amar mais de uma pessoa é uma escolha que pode expandir o potencial para dar e receber amor.
  • Nova crença básica 2: meu(minha) parceiro(a) é tão confiante em mim e em nosso relacionamento que ter outros parceiros não irão provocar ciúmes, nem a ideia de que isso irá destruir nosso amor.
  • Nova crença básica 3: apesar do arranjo socialmente fora do comum que nós estabelecemos na nossa vida amorosa, eles foram acordados de forma consciente e responsável por todos os envolvidos. Nós insistimos em integridade e nossos relacionamentos.

Assim, os adeptos do poliamor acreditam que uma relação sincera, consciente e responsável, ao contrário de gerar ciúmes, gera confiança e liberdade para que outros relacionamentos possam surgir.

Outras forma de relacionamento que apresenta características semelhantes às do poliamor, são os relacionamentos adeptos ao menage-à-trois ou swing. Estes costumam ser casais héteros (mas também podem ser casais homossexuais ou bissexuais) que possuem relacionamentos estáveis, namoro ou casamento, mas possuem uma abertura para a inclusão apenas sexual de novas pessoas dentro da relação de forma momentânea.

O menage-à-trois consiste em um casal, geralmente hétero, que aceita incluir na relação sexual uma mulher ou homem, de forma momentânea. O trio pode incluir tanto interação bissexual, como também pode ser de orientação apenas heterossexual. Já no swing o casal encontra outro casal também adepto da prática. Geralmente os dois casais saem juntos para conversar e depois fazem sexo com o parceiro do outro casal. Uma troca de parceiros que em seguida passam a ter relações sexuais num mesmo espaço ou em espaços separados. Os casais podem se relacionar apenas entre si, ou ainda de forma grupal. A interação costuma se heterossexual, mas também existem relações que envolvem bissexualismo.

Enquanto no poliamor é preciso haver uma relação estável, afetiva e de convivência entre os envolvidos, na prática do ménage ou do swing, o envolvimento é apenas sexual.

O menage-à-trois consiste em um casal, geralmente hétero, que aceita incluir na relação sexual uma mulher ou homem, de forma momentânea.

Enquanto no poliamor o sexo pode nem existir, no menage-à-trois ou swing, os adeptos encaram estas práticas como uma brincadeira, uma aventura sexual e excitante. Os encontros podem ser únicos, ou serem mais regulares, porém os novos parceiros não passam a integrar o casal, mantendo uma separação emocional (de certa forma) e da intimidade.

Novamente esta forma de se relacionar apresenta elementos de instabilidade e experimentação, assim como busca ampliar a liberdade sexual individual e ressignificando o conceito de ciúmes e fidelidade. Os adeptos destas práticas também costumam desenvolver uma relação de consumo ligado a estas práticas. Existem diversos clubes de swing em todo o país e festas que movimentam muitas pessoas e produtores, criando até mesmo uma cultura do swing.

Geralmente esses clubes têm espaços para o sexo coletivo, mantendo a discrição e o anonimato. Além de incluir espaço de boate e bar, oferecendo espaços de “curtição” e consumo.

Com o desenvolvimento da internet, muitos sites e aplicativos de celular. Esses espaços virtuais congregam pessoas de diversas localidades que buscam ter experiências de menage-à-trois ou swing mantendo a discrição. A rede permite a criação de um espaço para encontrar pessoas semelhantes facilitando e ampliando a possibilidade de encontros e experiências.

A internet teve papel fundamental nas relações amorosas, especialmente a partir do século XXI. No início da internet as tecnologias permitiram a manutenção de relacionamentos de longas distâncias onde o contato físico não existe. Diferente do correio ou telefone, a internet permitiu não apenas uma comunicação mais constante entre pessoas afastadas, mas criou espaços para que as pessoas se conhecessem. No entanto, esses espaços são virtuais. As salas de bate-papo, ou chats permitem a interação de várias pessoas ligadas por localidades ou interesses diversos. A presença física (a beleza, os esterótipos e padrões estéticos) que em muitos casos podem ser barreiras para que pessoas se conheçam, no campo virtual, podem ser amenizadas.

Hoje a facilidade para enviar fotos e até mesmos vídeos pela internet tem facilitado ainda mais as relações virtuais, incluindo o sexo virtual. Pessoas que vivem geograficamente distantes se relacionam sem nenhum contato físico ou com poucos encontros.

Mas com uma dinâmica diferente, o virtual pode contribuir para que as pessoas se apresentem de forma diferente, permitindo a troca de ideias e diálogos antes do impacto das questões físicas:

No entanto, o amor virtual não se trata apenas de um relacionamento tradicional a distância. O que pode separar as pessoas pode ser o fato de uma delas já ser casada, por exemplo (fato que tem causado muitos debates sobre internet e fidelidade conjugal).

A internet, como já citamos, tem criado novas ferramentas para adeptos do menage-à- trois, do swing e do poliamor, facilitando encontros, pois ajuda a unir interesses comuns independente da localização geográfica, ao mesmo tempo em que mantém certo anonimato, criando um espaço mais seguro para que os interessados manifestem suas preferências e desejos.

O que é posto, e não parece ter mais volta, é que não existe mais apenas uma maneira de se relacionar. As novas formas de relacionamento estão aí, vieram para ficar e apresentam reflexo de uma sociedade conectada que preza sua individualidade e liberdade, colocando estes valores acima do relacionamento monogâmico “feliz para sempre”.

*As opiniões contidas neste artigo são de responsabilidade do autor.

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