O mês é março de 2022, século 21, e as mulheres ainda precisam de autorização do marido para realizar a laqueadura tubária. Isso mesmo que você leu: au-to-ri-za-ção. Parece até um conto muito antigo, mas não é. Agora, a história começa a mudar de configuração. No último dia 8, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto de lei que retira a exigência de consentimento do cônjuge para fazer a esterilização. A aprovação veio no Dia Internacional da Mulher, simbolizando um importante avanço nos direitos das mulheres.

Atualmente, a legislação determina que mulheres casadas tenham permissão expressa do parceiro para a realização da laqueadura. Ou seja, elas ficam à mercê da decisão do marido sobre a possibilidade de ter ou não filhos em algum momento de suas vidas.

O que a mudança significa na prática? Caso o projeto de autoria da deputada Carmen Zanotto (Cidadania – SC) seja aceito em todas as instâncias, as mulheres poderão optar pela laqueadura tubária de forma voluntária, independente de aprovação do marido. O procedimento poderá ser feito, inclusive, durante o período de parto. Por enquanto, isso só pode acontecer em “casos de comprovada necessidade, por cesarianas sucessivas anteriores”. Neste caso, a mulher deve fazer o pedido com pelo menos seis meses de antecedência em relação ao parto e apresentar boas condições médicas.

O texto também propõe a redução de 25 para 21 anos a idade mínima para realizar a cirurgia. O mesmo é válido para os homens, que não precisarão mais do aval de suas esposas para fazer a vasectomia. Atualmente, a legislação prevê o procedimento para homens e mulheres maiores de 25 anos ou, pelo menos, com dois filhos vivos.

Além da laqueadura, outro assunto levantado na proposta são os métodos contraceptivos. O projeto garante que a oferta de qualquer método e técnica de contracepção seja oferecida por parte dos profissionais, serviços e empresas de saúde no período máximo de 30 dias. Isso por que, segundo a autora, a dificuldade para as mulheres conseguirem ter acesso é notável, principalmente em relação à inserção do Dispositivo Intrauterino (DIU). Está prevista ainda uma punição ou multa para quem dificultar ou impedir o acesso aos métodos contraceptivos.

Como funciona a laqueadura tubária

A laqueadura, também conhecida como “ligadura de trompas”, é um processo de esterilização feminina realizada por meio de uma cirurgia que corta ou amarra as trompas, impedindo que o óvulo e o espermatozoide se encontrem.

Considerado um procedimento simples, a laqueadura é feita de forma gratuita pelo SUS (Sistema Único de Saúde). Só em 2019, foram realizadas 73.658 laqueaduras pela rede pública de saúde, conforme dados do DataSus, do Ministério da Saúde.

A procura pela cirurgia é grande, justamente por ser um método definitivo, que previne a gravidez sem a necessidade de ingerir hormônios ou lembrar de tomar a pílula, por exemplo. Além disso, não tem efeitos colaterais, não afeta a libido e tem baixa taxa de falha, com menos de 1%.

Ainda assim, muitas mulheres encontram dificuldades para fazer a laqueadura por negativa médica, não realização do procedimento em alguns hospitais, falta de interpretação da lei, entre outras barreiras. Um fator decisivo também é o machismo instalado na sociedade, em que permite que profissionais de saúde opinem e até decidam pela mulher.

Próximos passos

Para a proposta entrar em vigência, ainda necessita de aprovação no Senado e da sanção presidencial. Caso isso ocorra, as regras passarão a valer em um prazo de 180 dias.

Ainda há um longo caminho pela frente, mas para a terapeuta sexual da Amoterapia, Wendy Palo, o projeto significa uma vitória para os direitos da mulher. “Numa sociedade que ainda objetifica os corpos femininos, na qual diariamente nós mulheres precisamos lutar pelo direito ao nosso corpo, um projeto de lei como este faz-se muito importante. Obviamente é um pequeno passo, mas seguimos – mesmo que a passos de formiga – sempre caminhando e lutando por uma sociedade na qual a equidade de gênero seja uma realidade e, assim, possamos finalmente decidir livremente sobre nossos corpos.”, opina.

Precisa de ajuda?